Participação da marca no mercado nacional variava entre 7 e 10%. Ford Ka e Ecosport formavam 84% do volume de vendas. Mas a Ranger continuará chegando, vinda da Argentina
A Ford resolveu fechar suas fábricas no Brasil – e isso não é mais novidade. Sem fábricas, vai continuar vendendo a picape Ranger, fabricada na Argentina. E certamente importando outros modelos. Por lei, a empresa precisa continuar fabricando peças para seus carros nos próximos dez anos. Mas como fabricar peças se não existem mais fábricas?
A Ford vendia bem a linha Ka e a Ecosport (84% de suas vendas), mas isso representava de 7 a 10% do mercado. Como agora se tornará uma importadora, tem outros desafios pela frente. Primeiro, sua rede de concessionárias deverá se desmantelar; segundo, o público perdeu a confiança na marca. Mesmo assim, a importadora vai enfiar goela abaixo dos brasileiros modelos feitos em outros países.
Importada da Argentina, a Ranger foi a terceira picape média mais vendida em 2020 por aqui. No último ano foram vendidas no Brasil 19.833 picapes, 14% do volume da marca. A terceira geração da Ranger está programada para 2023. O Territory, SUV médio, é importado da China, o que não permite preço competitivo. Com bons predicados, ele é vendido a partir de R$ 179.900. Em 2020, foram vendidas 1.558 unidades, 1,1% do volume da marca. O Mustang é e continuará sendo um ícone; foi o segundo esportivo mais vendido no Brasil em 2020, com 350 unidades, 0,25% de participação no volume da Ford. A novidade para 2021 é a chegada da versão Mach 1, ainda mais esportiva.
O Edge ST, SUV de luxo de porte médio, o Edge tem volume tão pequeno que nem figura entre os 40 utilitários-esportivos mais emplacados de 2020 no ranking da Fenabrave. Importado do Canadá, o modelo custa a partir de R$ 351.950.
E podem chegar outros modelos, como o Bronco Sport. Fabricado no México, o Bronco viria sem imposto de importação. O SUV médio é fabricado em estrutura monobloco e sua carroceria faz uma fusão entre as linhas retilíneas de um jipe e o porte de um utilitário-esportivo. A Nova Transit será montada na fábrica da Nordex, no Uruguai, e também está confirmada para o mercado brasileiro. Existem versões para passageiros, para carga e chassi-cabine, mas ainda não se sabe quais estarão disponíveis para os brasileiros. A Ford cogita também outros modelos, como o novo Mustang e o Maverick – mas não o Maverick que já existiu por aqui, e sim uma SUV – só vão aproveitar o nome.
O receio dos atuais donos de carros da marca Ford é a desvalorização na revenda, e o risco de furtos e roubos – logo não haverá peças de reposição, e carros serão levados para desmanche.
Fábrica fechou, mas consumidor tem direitos
A empresa garante que manterá serviços de assistência ao consumidor, mas em caso de dúvidas, tem especialista para esclarecer questionamentos em relação ao tema
A Ford está fechando três centros de produção no Brasil e agora os carros vendidos em terras tupiniquins serão importados, especialmente de países vizinhos, como Argentina e Uruguai. Na prática, com o fim da fábrica de Camaçari (BA), sairão de linha os Ka, Ka sedan e EcoSport. No centro de produção de Taubaté (SP) eram produzidos motores e transmissões. Em Horizonte (CE) eram produzidos automóveis da Troller. E após as já costumeiras troca de farpas das autoridades com relação ao problema, chega a hora do consumidor pensar nas consequências do encerramento da produção da montadora no Brasil.
Em pronunciamento, a Ford deixou claro que a manutenção dos serviços e assistência ao consumidor serão mantidos: “A Ford atenderá a região com seu portfólio global de produtos e mantém assistência total ao consumidor, com operações de vendas, serviços, peças de reposição e garantia para seus clientes no Brasil e na América do Sul”, afirma em nota oficial.
Segundo a advogada especializada em direito do consumidor Simone Magalhães, ouvida pelo Correio Braziliense,, a legislação brasileira não engloba esse caso em específico, mas existem parâmetros que podem cobrir a situação: “A gente não tem algo que discipline esse caso em específico (fechamento de fábricas com manutenção de produtos), a gente tem previsão no Código de Direito do Consumidor que é o não deixar o consumidor desassistido, ou seja, no caso do automóvel, isso significa ter oferta de peças, ou outros matérias importantes para o produto, os fabricantes precisam manter no mercado de consumo uma disponibilidade de equipamentos”.
A advogada explica que esse amparo” não tem prazo específico, mas deve seguir por longo período no caso de automóveis: “Não tem um prazo específico, mas o Código fala de um tempo compatível com a vida útil do produto, e em caso de automóveis a gente pensa em uma vida útil longa”.
Simone ainda aponta que a credibilidade da montadora pode jogar a favor do consumidor: “Como é uma empresa de renome, a gente espera uma rede de assistência ampla e ativa que possa auxiliar os consumidores que confiaram na marca”. Porém, se isso não ocorrer, a advogada explica o que o consumidor pode fazer. “Em geral, a recomendação é procurar os órgãos de defesa do consumidor, como o Procon, ou promover ação na Justiça. O nosso temor nesse caso em específico da Ford é ela eventualmente não deixar meios viáveis para o auxílio do consumidor. A responsabilização da empresa, nesse cenário, pode se tornar muito difícil, a manutenção desses direitos podem ficar comprometidos, porque houve uma saída de atuação, então a expectativa é que a empresa honre de fato seus deveres”.
Mesmo sendo um caso mais extremo, Simone também fala sobre os consumidores que compraram um carro da marca recentemente e tem medo do futuro sem produção própria no Brasil. “Uma dúvida que muitas pessoas me passaram ao longo do dia é no sentido de quem comprou um carro recentemente, se elas podem rescindir um contrato. A gente não tem previsão disso (no âmbito legal), eu não vejo como algo que se viabilize na prática. Apesar de que eles podem tentar conversar com os vendedores e tentar alguma negociação, mas legalmente não vejo um amparo completo nesse sentido de rescindir contrato (com a notícia do fechamento das fábricas)”.
Tudo isso cria um cenário desanimador para quem tem carros da marca. A montadora diz que venderá as unidades do Ka, Ka Sedan e EcoSport que estão em estoque, já que a produção será imediatamente interrompida. Mas quem terá a coragem de comprar qualquer um desses modelos depois desse anúncio? É sabido que o mercado de usados é cruel e costuma desvalorizar muito os modelos fora de produção, salvo raras exceções. E existe grande chance de isso acontecer com os modelos Ford.
Participação no mercado (2020)
- General Motors (GM) 17,35%,
- Volkswagen 16,80%
- Fiat 16,50%
- Hyundai 8,58%
- Ford 7,14%
BNDES cobra Ford; empréstimos passam de R$ 300 milhões
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) cobrou explicações da Ford sobre a decisão de finalizar a produção no Brasil. Atualmente, dois empréstimos estão ativos, no valor de R$ 335 milhões, para desenvolvimento de novos veículos e ações sociais.
De acordo com o portal de transparência do BNDES, as dez maiores operações da Ford com a instituição somam quase R$ 2 bilhões. A aquisição de novas tecnologias e a exportação de automóveis estão entre as solicitações de auxílio financeiro ao governo federal.
Um dos contratos firmados com a Ford, em 2014, custou ao BNDES R$ 178 milhões. O pedido da verba pela concessionária teve como objetivo desenvolver novas tecnologias e apoiar a aquisição de máquinas e equipamentos para a fábrica de Camaçari (BA).
Em nota, a Ford justificou o fechamento devido aos grandes prejuízos financeiros causados pela pandemia de Covid e à pouca rentabilidade com a venda dos veículos. A empresa afirmou ainda que todas as medidas possíveis foram tomadas, até a decisão de encerrar a produção.




