Silenciosas e potencialmente fatais, as hepatites virais afetam o fígado e podem evoluir para cirrose, insuficiência hepática e câncer. Segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde, os casos de hepatite A aumentaram 90% no estado de São Paulo entre 2024 e 2025. No primeiro semestre de 2025, foram registrados 949 casos da doença, contra 498 no mesmo período do ano anterior.
Os dados reforçam este Julho Amarelo, que tem o dia 28 instituído pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como o Dia Mundial de Luta contra as Hepatites Virais. No Brasil, a campanha destaca a importância da prevenção, do diagnóstico precoce e do tratamento adequado. Ainda segundo a OMS, mais de 1,3 milhão de pessoas morrem todos os anos no mundo em decorrência dessas doenças.
Para a infectologista Vera Rufeisen, do Vera Cruz Hospital, as hepatites configuram um desafio global. “A alta prevalência, a transmissão silenciosa e a ausência de sintomas na maioria dos casos dificultam o diagnóstico precoce e contribuem para a elevada mortalidade”, explica.
Os cinco tipos
As hepatites virais são classificadas em cinco tipos: A, B, C, D e E. Os tipos A e E são geralmente transmitidos por água ou alimentos contaminados. Já os tipos B, C e D se espalham principalmente pelo contato com sangue contaminado, relações sexuais desprotegidas e, no caso da hepatite B, também da mãe para o bebê durante o parto. “As hepatites A e E costumam ter evolução autolimitada, mas podem ser graves em grupos vulneráveis. Já as hepatites B e C apresentam maior risco de se tornarem crônicas e, ao longo dos anos, podem levar a complicações hepáticas irreversíveis”, alerta a especialista.
Sintomas como febre, cansaço, dor abdominal, icterícia, urina escura, fezes claras e náuseas podem surgir nas fases agudas, mas a maioria das infecções segue sem sintomas aparentes, dificultando a detecção precoce, essencial para evitar complicações graves. Segundo Vera, muitos pacientes só descobrem a patologia em estágios avançados, quando já desenvolveram cirrose ou câncer no fígado. “Isso ocorre principalmente nas hepatites B e C, que costumam evoluir de forma silenciosa, sem sintomas que levem à busca por atendimento médico. Por isso, a testagem regular, especialmente nos grupos sob maior risco, é uma das estratégias mais eficazes para interromper a progressão da doença e iniciar o tratamento a tempo”.
A boa notícia é que os avanços no tratamento da hepatite C permitem a cura em mais de 95% dos casos, com uso de antivirais de ação direta, em regime ambulatorial. Já no caso da hepatite B, o tratamento visa o controle da infecção, a chamada “cura funcional”, embora a eliminação total do vírus ainda seja rara. Hepatites A e E, em geral, não requerem tratamento específico, apenas suporte clínico.
A médica destaca que a testagem sorológica, disponível gratuitamente pelo SUS, é uma das principais estratégias para interromper a transmissão e iniciar o tratamento no tempo certo. “Todos devem ser orientados a realizar o teste, especialmente quem integra grupos de risco: profissionais da saúde, imunossuprimidos, pessoas vivendo com HIV, usuários de drogas injetáveis, gestantes, idosos e pessoas privadas de liberdade”.
Imunização
A principal forma de prevenção, porém, continua sendo a imunização. As vacinas contra os tipos A e B são eficazes, seguras e estão disponíveis gratuitamente nos postos de saúde e nos Centros de Referência em Imunobiológicos Especiais. A imunização contra a hepatite B é recomendada desde o nascimento e, em casos de gestantes infectadas, a aplicação de imunoglobulina específica no recém-nascido contribui para evitar a transmissão vertical.
Outras medidas preventivas incluem a triagem rigorosa de sangue e hemoderivados; práticas seguras em atendimentos médicos e odontológicos; uso de preservativos em todas as relações sexuais; não compartilhamento de seringas, agulhas, lâminas, escovas de dente e outros objetos perfurocortantes; além de cuidados com a higiene na manipulação de alimentos e no consumo de água potável.
A meta da OMS é eliminar as hepatites virais como ameaça à saúde pública até 2030, com ampliação do acesso ao diagnóstico, tratamento e vacinação, além de práticas seguras nos serviços de saúde. “A expansão da testagem, a capacitação das equipes e a redução de comportamentos de risco são medidas essenciais para prevenir novas infecções e salvar vidas”, afirma a infectologista, que reforça ainda que o maior inimigo das hepatites é o silêncio. “A única forma de combater é com informação, prevenção e diagnóstico precoce. O Julho Amarelo é um chamado à ação: quanto mais cedo identificarmos e tratarmos as hepatites, maiores as chances de cura e menores os riscos de complicações.”