Com a queda de um avião de pequeno porte na última sexta-feira (7), em uma avenida de São Paulo, que resultou em dois mortos, o número de vítimas em acidentes com aviões particulares subiu para dez neste ano. Esse foi o 22º acidente aéreo registrado em 2025, de acordo com dados do Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos).
Não é apenas uma sensação de quem acompanha o noticiário: os acidentes com aviões particulares estão se tornando mais frequentes no Brasil.
Em 2024, o Cenipa registrou o maior número de acidentes aéreos dos últimos dez anos, com 175 ocorrências que resultaram em 152 mortes. Esse número supera o de 2015, quando foram registrados 172 acidentes e 79 vítimas fatais.
O aumento começou em 2022, com 138 acidentes e 49 mortos. Em 2023, esse número saltou para 155 acidentes e 77 mortes, refletindo uma tendência preocupante no setor da aviação privada no Brasil.
Raul Marinho, diretor técnico da Abag (Associação Brasileira de Aviação Geral), atribui o aumento no número de acidentes à grande expansão da frota de aviões no Brasil após a pandemia.
De acordo com dados da Abag, em 2022, no final da emergência de saúde, o Brasil contava com 9.607 aviões executivos. Já em outubro de 2024, esse número subiu para 10.484 aeronaves, o que explica, em parte, o crescimento dos acidentes aéreos registrados nos últimos anos.
Menos segurança e condições
Raul Marinho acredita que o aumento de acidentes com aviões particulares no Brasil pode ser atribuído a três fatores principais. O primeiro é estatístico: menos de 5% da frota brasileira é composta por aviões de linhas comerciais, enquanto 95% são de aviação executiva, sendo que 80% dessa categoria é de aviação privada. Com isso, é provável que a maioria dos acidentes aconteça com aviões menores.
O segundo fator apontado por Raul Marinho é que “o segmento de aviação geral opera com uma estrutura muito mais simples e limitada do que a aviação comercial, onde atuam as grandes companhias”.
Segundo Raul Marinho, os voos comerciais operam nos 150 maiores aeroportos do Brasil, que são também os mais seguros e bem equipados, com infraestrutura como torre de controle, estação meteorológica e fiscalização constante das condições da pista.
Já a aviação geral de pequeno porte, por sua vez, opera em todos os 5.000 aeroportos do país, muitos dos quais não possuem a mesma estrutura. “Esses aeroportos podem ter pistas de terra, grama ou cascalho, a cerca pode estar danificada, permitindo a entrada de animais, e até lixões ou presença de pássaros nas proximidades”, afirma Marinho.
O terceiro fator, segundo Raul Marinho, é a fiscalização menos rigorosa da aviação privada em comparação com a aviação comercial e táxi aéreo. O diretor técnico da Abag explica que a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) parte do pressuposto de que, “se o avião é seu, o problema é seu”, uma vez que a aviação privada não pode cobrar pelo transporte de passageiros. Isso resulta em uma menor fiscalização e maior risco para a segurança dessas aeronaves.
Em outras palavras, é responsabilidade do dono ou operador da aeronave garantir as questões de segurança e cumprir as normas estabelecidas pela Anac. Segundo Marinho, a aviação privada não passa por um processo de “vigilância continuada”, como ocorre na aviação comercial, o que pode comprometer a segurança e aumentar os riscos de acidentes.
Julgamento do piloto
Outro fator importante é a exigência de pilotos. A Anac exige que aviões destinados ao transporte de passageiros, tanto os comerciais quanto os de táxi aéreo, tenham dois pilotos a bordo, além da contratação de diretores técnico e de operações. No entanto, essa exigência não se aplica da mesma forma à aviação privada, o que pode comprometer a segurança em voos com apenas um piloto.
A aviação executiva, no entanto, não possui essa estrutura. “Quando um avião chega, por exemplo, em Ubatuba e o piloto percebe que a pista é pequena e o tempo não está favorável, um táxi aéreo tem o copiloto e uma estação de controle para orientá-lo. Já em um avião particular, não há esse apoio. O piloto decide sozinho”, explica Raul Marinho.