O ex-candidato do PDT à Presidência da República, Ciro Gomes, tinha se colocado 100 dias de prazo para se pronunciar sobre o governo Jair Bolsonaro. “Em respeito aos 57 milhões de eleitores que o escolheram”, diz. Não conseguiu chegar lá. Reabilitou a metralhadora giratória. E a dirige primeiro aos ministros militares.
Elogia o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno (“honesto e patriota”), mas cobra co-responsabilidade na venda da Embraer, na ida de um general brasileiro para o Comando Sul das Forças Armadas dos EUA e nos exercícios militares na fronteira da Venezuela.
Em entrevista ao Valor Econômico ele disse:
Valor: Que balanço o senhor faz da largada do governo Bolsonaro?
Ciro Gomes: Não em homenagem a ele, que não merece, mas aos 57 milhões que votaram nele, me propus a tentar trazer de volta um mínimo de convivência democrática, reconhecer a derrota, desejar boa sorte e dar 100 dias para formar equipe e começar a governar. Mas é tudo tão grave que já me obriguei a falar sobre algumas coisas, como a gravíssima patuscada na questão Venezuela, da China e do mundo árabe. Tem ainda a sustentação política, que é um moralismo de goela, como mostrou o caso Queiroz/Flávio Bolsonaro.
Valor: A intervenção dos ministros militares não foi capaz de reverter os danos com a Venezuela e com a China?
Ciro: É fato que os militares têm se revelado um fator moderador. Por outro lado, num país sul-americano, ver se construindo gradual e consistentemente uma tutela militar é muito ruim. Não dará em boa coisa.
Valor: Qual é o projeto dos militares que estão hoje no poder?
Ciro: É a tutela militar, visando ao poder. Para quem conhece o caminho de truculência do general [Hamilton] Mourão e o vê agora como esse doce contraponto diário das diatribes e loucuras do Bolsonaro, só se deixa enganar se for um petista muito imbecil, como há muitos que infestam a vida brasileira. Tu acredita que tem petista conversando com Mourão?
Valor: Que pontes o PT está lançando com Mourão?
Ciro: Vou conversar com meu amigo Samuel Pinheiro Guimarães para saber que história é essa.
Valor: É ele a ponte?
Ciro: É um deles.
Valor: São pontes em torno da questão nacional ou pela acomodação da reforma da Previdência?
Ciro: Mourão é um oportunista que está muito bem guiado no marketing. E duvido que a venda da Embraer que ele aprovou seja de interesse nacional.
Valor: Mourão está agindo para assumir o governo?
Ciro: Só um pato não vê.